Cientistas da EACH/USP pretendem programar robôs para ajudar no cuidado de idosos

Postado em 03 de novembro de 2022

Robôs trabalhando ao lado de profissionais da saúde ajudando no cuidado de idosos que moram em instituições de longa permanência. Pode parecer a descrição de uma história futurista, mas já está se tornando realidade. No Brasil, cientistas da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, atuantes na área de Sistemas de Informação e Gerontologia, têm se dedicado à programação dessas máquinas em parceria. Estudos internacionais já demonstraram que os chamados “robôs sociais” ou “robôs de companhia” podem apresentar efeitos terapêuticos e ajudar a melhorar a disposição, o engajamento social, o bem-estar e a qualidade de vida de idosos que tenham problemas cognitivos.

“Robôs sociais” são aqueles que simulam a atitude humana e podem ajudar as pessoas por meio de interações. Esse tipo de tecnologia tem sido testada em diversos contextos, por exemplo, como robôs de serviço para comunicação com pacientes isolados em hospitais, como robôs terapêuticos para crianças autistas e até mesmo como robôs de companhia para idosos solitários. Com uma grande flexibilidade de programação, os robôs conectados à internet são aprimorados com inteligência artificial e equipados com câmeras, microfones, sensores, alto-falantes e telas que captam, armazenam e apresentam informações personalizadas.Z

 

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Os pesquisadores da EACH, com apoio do Centro de Inteligência Artificial – C4AI – (fruto de uma pareceria da IBM, da FAPESP e da USP), têm trabalhado com o robô brasileiro Robios, da empresa Human Robotics, que é capaz de se comunicar em português. A versão Robios Go é composta por um corpo no formato de um totem que pode se movimentar em qualquer direção e um tablet que simula o seu rosto. Ele pode ser programado para exibir imagens de locais ou fotografias de familiares e amigos, fazer videochamadas, conversar sobre que dia da semana ou mês é hoje, qual a estação do ano e como está o tempo na cidade, quais são as últimas notícias dos esportes, do município e do país, além de ouvir música ou participar de jogos simples, dentre outras atividades pré-planejadas.

O professor Marcelo Fantinato, docente da EACH/USP, explica que, no caso dos idosos, os robôs de companhia podem ajudar em diferentes ações, seja para prevenção, diagnóstico ou monitoramento. “Eles podem executar tarefas simples como lembrar o paciente da hora de tomar um remédio, mas também podem ser programados para analisar o comportamento do idoso para identificar se ele está apresentando indícios de depressão e reportar essa informação para uma pessoa responsável ou mesmo estimular o usuário a ter interesse por alguma atividade que possa melhorar o seu quadro. São várias possibilidades”, descreve.

Em todo o mundo, o número de pessoas com mais de 60 anos cresce rapidamente. Projeções da Organização das Nações Unidas (ONU) indicam que, em 2050, haverá no planeta mais idosos do que habitantes com menos de 15 anos. Esse envelhecimento da população traz grandes desafios para a sociedade, como o aumento das demandas de saúde, sociais e econômicas, principalmente para países em desenvolvimento e de grande desigualdade, como o Brasil. O crescente aumento do número de idosos com doenças neurodegenerativas e, consequentemente, a necessidade de assistência adequada de suas demandas, impõem obstáculos ainda maiores para o futuro da população brasileira.

De acordo com os especialistas, o bem-estar dos idosos com demência que moram em instituições de longa permanência é prejudicado, pois eles passam boa parte do tempo sozinhos, com pouco envolvimento em atividades significativas. Por outro lado, estar ativamente envolvido em interações com outras pessoas dentro de um contexto social pode proteger o idoso de ter pioras cognitivas. Além disso, familiares e cuidadores também podem se beneficiar, reduzindo a sobrecarga de cuidados, que podem diminuir em função do engajamento em atividades significativas e prazerosas para o idoso. O grupo de pesquisa, que conta com as pesquisadoras Meire Cachioni, Ruth Caldeira de Melo e Monica Sanches Yassuda da área de gerontologia, e Marcelo Fantinato, Sarajane Marques Peres, Karina Valdivia Delgado e Valdinei Freire da área de computação pretendem avaliar em que grau as atividades realizadas com o robô Robios podem melhorar o engajamento cognitivo de idosos brasileiros com demência em casas de repouso.

Segundo os estudiosos da área, a implantação de robôs no cotidiano de idosos com comprometimento cognitivo ou demência tem se mostrado um campo promissor, mas ainda é um processo emdois robos desenvolvimento, que envolve fatores bastante complexos. Portanto, a pergunta é: os robôs sociais podem, mesmo, auxiliar no tratamento ou na minimização do sofrimento psicológico humano? Em diferentes continentes, as pesquisas de aprimoramento e de aplicação em robótica socialmente assistiva se amplificam de forma rápida, resultando em produtos com potencial para contribuir na assistência em saúde. Um estudo preliminar realizado pelos pesquisadores trouxe indícios de que os idosos brasileiros têm disposição em aceitar bem esse tipo moderno de cuidado.

Instalado na sede do Inova USP, em São Paulo, o Centro de Inteligência Artificial realiza diversas pesquisas e em diferentes subáreas da Inteligência Artificial. “Estudamos o desenvolvimento desta área e a interação de robôs com a sociedade. Queremos formular diretrizes e protocolos para esse tipo de tecnologia que visem estabelecer relações éticas e seguras entre pessoas e máquinas”, ressalta a professora Sarajane Marques Peres, docente da EACH e pesquisadora do C4AI.

Ela lembra que a robótica em si já provocou várias discussões desse tipo, mas ao direcionar o uso de robôs sociais especificamente para idosos e, principalmente, para idosos com demência, tais questões podem ainda ser mais sensíveis, já que pessoas com comprometimento cognitivo podem ser mais afetadas pelo uso descuidado de dispositivos, o que pode levar a perda ou invasão de sua privacidade, por exemplo. A professora alerta que, dependendo do grau de comprometimento cognitivo, essas pessoas poderiam inclusive não diferenciar um robô de uma pessoa, dependendo da qualidade da máquina, o que poderia levar a um debate se, nesse contexto, seria ético colocá-los em interação com os robôs, mesmo pensando em colaborar com a sua própria saúde.

 

*Por Henrique Fontes e Eduardo Sotto Mayor