Professores da EACH integram grupo de pesquisadores com acesso inédito à base de dados do Facebook

Postado em 02 de maio de 2019

O Facebook anunciou que irá abrir seus dados internos para pesquisadores estudarem o impacto das redes sociais nas democracias e nas eleições, como parte de um esforço para evitar a manipulação nessas plataformas. De acordo com a rede social, cerca de 60 pesquisadores, de 30 instituições acadêmicas de 11 países, foram selecionados após um processo realizado pela entidade de pesquisa Social Sciences Research Council junto ao grupo independente da Social Science One. No Brasil, dois professores da USP foram selecionados para acessarem a base inteira de dados de compartilhamento de links na plataforma. O Jornal da USP no Ar conversou sobre o assunto com Pablo Ortellado, professor do curso de Gestão de Políticas Públicas, e com Marcio Moretto, pesquisador do curso de Sistemas da Informação. Ambos são da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP.

Ouça a entrevista:

 

Um ano após o escândalo da Cambridge Analytica – quando a empresa de consultoria política utilizou os dados do Facebook de maneira maliciosa para intervir nas eleições norte-americanas de 2016 -, a rede social retoma o compartilhamento de dados com a comunidade científica e o grupo de pesquisa do professor da USP foi um dos 12 selecionados em todo o mundo para ter acesso a esses dados. O Facebook dará acesso a toda base de links do ano de 2017, que envolve 2 bilhões de usuários da plataforma. “A partir de agora, a gente vai fazer um estudo investigando as relações entre o consumo de link de notícias, as características demográficas dos mais jovens aos mais velhos e quem consome imprensa hiperpartidária de esquerda e de direita”, conta Ortellado.

Cambridge Analytica utilizou os dados do Facebook de maneira maliciosa para intervir nas eleições norte-americanas de 2016 – Foto: Visual Hunt

“A nossa ideia é explorar quais são os sites de notícia mais compartilhados aqui no Brasil. Uma vez que a gente tenha os sites mais compartilhados, vamos fazer estudos mais sofisticados e ver como que isso está relacionado ao perfil demográfico desses usuários”, e também entender as diferenças entre o consumo de mídia da imprensa tradicional e o consumo de mídia hiperpartidária, complementa Moretto. De acordo com Ortellado, a questão “se não tivesse havido esse compartilhamento de notícias falsas, o resultado eleitoral seria diferente?” não pode ser respondida por não ser um parâmetro possível de ser isolado: “O que a gente consegue responder é ver o tamanho desse comportamento e constatar que ele foi relevante”. Os dados podem indicar se quem compartilha links de determinada natureza compartilha links também de outra natureza e quantos usuários compartilham informação da manchete sem terem aberto e lido a notícia.

O WhatsApp não tem dados públicos, visto que é uma rede privada para amigos e familiares – Foto: Allan White/ Fotos Públicas

O professor também comenta que há três caminhos para regular notícias falsas. Um deles é que o Facebook pode tomar medidas que vão impedir ou regular determinados comportamentos dentro da plataforma. Outro é regulação estatal, em que os governos nacionais criam leis que regulamentam as plataformas. Por fim, é possível fazer também por meio da Justiça Eleitoral, que seria uma espécie de regulação mais restrita ao período de eleições.

Outra questão que merece destaque é o fato de o WhatsApp estar ultrapassando o número de usuários no Facebook “e tende a se tornar a principal ferramenta de comunicação digital dos usuários que têm acesso à internet, e as campanhas eleitorais migraram o foco: estão investindo menos no Facebook e mais no WhatsApp”, afirma Ortellado. O maior problema é o impasse de liberdade individual versus segurança coletiva, porque o WhatsApp não tem dados públicos e nem pode ser monitorado, visto que é uma rede privada para amigos e familiares. Por mais que uma rede privada seja “uma grande conquista da sociedade civil como uma resposta aos escândalos que o Edward Snowden trouxe à tona, existe aí um conflito entre esse espaço privado de conversa com a regulamentação do debate público”, analisa Moretto.

*Do Jornal da USP