Modelagem teórica da física propõe nova abordagem terapêutica para câncer com metástase
Postado em 14 de junho de 2021

Uma modelagem teórica da física ajudou um grupo de pesquisadores no desenho de uma nova abordagem terapêutica que reduz a expressão de uma rede de sinais de metástases tumorais. A estratégia, que utiliza baixas doses de múltiplos medicamentos, diminuiu os efeitos compensatórios (criação de novas vias para disseminação das células cancerígenas), a adaptação ao tratamento e a recidiva da doença. A modelagem é a base teórica do estudo genético feito em camundongos com câncer de mama no The Ben May Department for Cancer Research, da Universidade de Chicago, EUA, em parceria com a Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP e o Centro de Investigação Translacional em Oncologia, do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), e a Faculdade de Medicina da USP (FMUSP). Um artigo sobre o assunto foi publicado na revista eLife, Limited inhibition of multiple nodes in a driver network blocks metastasis, em maio de 2021.
“O câncer é uma doença complexa e a fase metastática (quando as células se desprendem do tumor de origem e colonizam um novo tecido) se caracteriza por inúmeros processos bioquímicos típicos de estresse celular. Estes atuam em uma rede de múltiplas vias (como se fosse uma organização de tráfego de dados) por onde as células cancerígenas criam a capacidade de se movimentar para colonizar outros tecidos do corpo, via corrente sanguínea”, explica ao Jornal da USP o físico Alexandre Ramos, professor de Cálculo Matemático da EACH e o responsável pelo modelo matemático.

Segundo o pesquisador, em condições normais, a proteína RKIP está presente em altas quantidades nas células saudáveis, porém, quando o câncer em estágio mais avançado acontece, essa proteína tende a cair a níveis baixíssimos e se eleva, por outro lado, o nível de outra proteína chamada BACH1. Ao contrário da RKIP, ela está associada ao processo de ativação de expressão de genes ligados à metástase, ou seja, a BACH1 estimula a movimentação das células cancerígenas. “Seria algo semelhante ao que acontece quando nos machucamos: as células em torno do machucado passam por uma transição e começam a adquirir capacidade de se multiplicar para recuperar o tecido ferido”, compara.
O pesquisador considera que o paralelo histórico ao momento atual da biologia molecular foi o período em que Tycho Brahe (astrônomo dinamarquês) obteve, no século XIV, dados astronômicos de altíssima qualidade que favoreceram o desenvolvimento dos modelos empíricos para as órbitas dos planetas propostos por Johannes Kepler (astrônomo alemão) e, posteriormente, a teoria da gravitação universal proposta por Isaac Newton. Dessa forma, “a biologia molecular mostra-se um campo potencialmente frutífero à formulação matemática de seus processos dinâmicos e a experiência oriunda da física pode ser bastante útil”, diz.